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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Livro: Operação Valquíria: O Complô Contra Hitler

Muitas histórias já foram contadas sobre a 2ª. Guerra Mundial (1938-1945), mas poucas mostram os oficiais alemães como pessoas que não concordavam com as atrocidades cometidas pelas forças de Hitler.

Poster do filme
Uma dessas histórias foi apresentada ao grande público alguns anos atrás com a estréia do filme Operação Valquíria (Valkyrie, 2008), dirigido por Brian Singer e estrelado pelo super-astro Tom Cruise no papel do coronel alemão Claus von Stauffenberg, figura central da conspiração que culminou no último atentado (de vários) contra Adolf Hitler planejados por figuras de alta patente de seu próprio exército.

O livro que aqui apresento, Operação Valquíria: O Complô contra Hitler – Memórias de um conspirador (Nous Voulions Tuer Hitler, 192 págs.), foi um dos vários lançados aqui no Brasil em 2009, na esteira do sucesso do filme.

Publicado pela editora Record e escrito com a ajuda do casal Florence e Jerome Fehrenbach, o livro narra as memórias de Philipp Freiherr von Boeselager, o último participante da conspiração a falecer em 2008.

Phillip em 2004
Philipp e de seu irmão mais velho Georg foram dois filhos do meio (de um total de nove) de uma família da aristocracia católica e rural alemã, que adoravam a emoção de cavalgar e de uma boa caçada.

Estudando desde cedo em colégios de jesuítas, os irmãos (muito próximos devido a pouca diferença de idade) tiveram uma educação fundamentada em valores clássicos de livre pensamento e temência a Deus, mas, crescendo à sombra da derrota alemã na 1ª Grande Guerra, escolhem o exército como carreira profissional motivados principalmente pelo espírito de camaradagem e defesa da pátria.

Desde cedo, porém observam a ascendência do partido nazista no governo de forma pouco simpática, principalmente pela sua austeridade após algumas intromissões na cidade onde moravam e também no jeito como os padres administravam sua escola.

Philipp narra vários episódios de sua carreira no exército (que começou pouco antes da 2ª Guerra ser declarada) gastando grande espaço do livro com as proezas de seu irmão Georg, que revela uma mente estratégica precoce ganhando promoções de patentes em pouquíssimo tempo de serviço militar.

Com riqueza de detalhes estratégicos, ele avança por batalhas em que participou pessoalmente na França e posteriormente no front russo, deixando claro que respeitava regras de combate e do tratamento humanitário a prisioneiros.
Phillip ao telefone em 1942.
Num episódio em particular, ele conta como, sendo um simples tenente, apontou a arma a um coronel alemão recém-chegado que queria massacrar um combalido batalhão francês logo após Phillip haver negociado pessoalmente um cessar-fogo. Tudo isso enquanto comandava apenas temporariamente aquele front.

A mudança de visão de Philipp em relação a guerra se dá de forma gradativa. Seu ódio ao Fuher só começa a despontar após testemunhar os maus-tratos que seus companheiros de batalha sofriam nos hospitais de guerra. Ele mesmo sofreu um ferimento grave no início de 1941 e teve que passar vários meses em recuperação num desses hospitais. Só conseguiu se curar completamente após ser transferido por causa de um pedido especial de seu irmão Georg, que havia ganhado uma medalha do próprio Hitler por seus feitos militares.

Seu tempo de cura permitiu reflexões constantes e sua posterior transferência para áreas de reserva e inteligência, longe do front de batalha, lhe fez encontrar gente com o mesmo tipo de pensamento que tinha contra os desmandos do atual regime.

Kluge no assento do carona e Phillip atrás, no meio, em 1942.
Sua convicção de matar Hitler se dá após um episódio em que conta como convenceu o marechal-de-campo Gunther von Kluge, do qual era assistente, a dar uma dura num dos líderes da SS (Polícia Militar criada pelo partido nazista), depois que descobriu que o “tratamento especial” colocado no relatório era o fuzilamento sumário, sem julgamento ou ordem direta, de judeus e ciganos capturados.

É interessante notar, de acordo com as memórias de Phillip, como os oficiais e soldados da Wehrmacht (a união do Exército, Marinha e Aeronáutica alemã), que estavam sempre na linha de frente das batalhas, tinham pouco conhecimento do que a SS e outras forças exclusivamente formadas por nazistas faziam em seu território natal.

Sempre haviam os boatos, mas muitos faziam vista grossa com medo de serem deserdados ou executados, apesar de outros ainda conseguirem se horrorizar e tomar uma atitude.

Ironia do destino, ou não, é que seu irmão Georg, após ser obrigado a abandonar seus companheiros de batalha no front e ser encarregado de instruir novos soldados, estivesse naquele momento tendo as mesmas conclusões que Philipp.

Entre conversas em salas de espera e desabafos fora de acampamentos em noites insones, os irmãos Boeselager são convidados a fazer parte do complô que queria assassinar Hitler e todo seu alto-escalão.

Kenneth Branagh interpretando Trescow.
É aí que aparece a figura do Major-General Henning von Trescow (que no filme é interpretado por Kenneth Branagh), um dos fundadores do movimento conspiratório e que levou a baila pessoalmente duas das quatro tentativas que o movimento fez para assassinar o Fuher.

O livro detalha o relacionamento de Phillip e Georg com Trescow e o envolvimento do próprio Phillip em algumas dessas tentativas.

A Operação Valquíria propriamente dita só é citada mais pro final do livro e o autor, que não teve contato direto com o Coronel Stauffenberg, a peça central do último atentado, narra como colaborou na elaboração de uma das bombas e como cumpriu sua missão, que era retirar discretamente 1200 cavaleiros do front de batalha para dar apoio as tropas que cercavam Berlim durante o golpe de estado mostrado no filme.

Phillip em 1945
Sem serem dedurados pelos conspiradores descobertos, os irmãos Boeselager disfarçam e retornam a um caótico e enfraquecido front sem despertar grandes suspeitas por parte de outros oficiais. Seu objetivo a partir de então era o de salvar tantos compatriotas quanto seria possível da morte já certa nas mãos dos aliados.

Georg não sobrevive a guerra e Phillip narra os detalhes de sua morte com extremo pesar. Um pesar só atenuado pelo fim da guerra e gratificante volta pra casa.

O casal que ajudou Phillip a escrever o livro, Florence e Jerome, também tiveram parentes envolvidos na guerra e fazem questão de frisar, no prefácio e posfácio, a ligação fortíssima entre os irmãos Boeselager e um episódio, não narrado por Phillip, sobre como ele ajudou a cumprir uma promessa de guerra feita ao avô de Florence.

Além disso, o livro conta com 8 páginas de fotos com a infância dos irmãos, seu período no exército e Phillip na atualidade, alguns anos antes de falecer.

Um belo registro histórico de uma época sangrenta e sofrida para e Europa e o mundo, que mostra que nem todos os alemães concordavam com a matança desenfreada, narrado de uma forma simples e direta, com uma perspectiva bastante íntima e inusitada do exército alemão.

Todos que se interessam por História (ou gostaram do filme) deveriam ler.

Recomendado!

Valeu!

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

Filme: O Espião que Sabia Demais

Pode haver mais segredos e conspirações entre os integrantes de uma agência de espionagem do que fora dela.

É o que se conclui ao final de O Espião Que Sabia Demais (Tinker Tailor Soldier Spy, 2011) novo filme do diretor sueco Tomas Alfredson, cujo último trabalho, o drama vampírico Deixa Ela Entrar (do qual já falei aqui), lhe abriu as portas para as grandes produções hollywoodianas.

Inglaterra.
Início dos anos 1970.
Em plena guerra fria, o chefe da inteligência britânica, Controle (John Hurt), é obrigado e se demitir após uma operação mal-sucedida em Budapeste e leva com ele o agente veterano George Smiley (Gary Oldman), que é resgatado do ostracismo por um velho conhecido para investigar secretamente a suspeita de que um dos quatro integrantes do alto escalão do serviço de espionagem inglês estaria passando informações sobre operações britânicas para a então União Soviética.

John Le Carré
O roteiro, escrito por Bridget O´Connor e Peter Straughan, é uma adaptação de um livro do autor inglês John Le Carré e tem a missão de apresentar pra toda uma nova geração os complexos e realistas espiões do escritor.

Um autor best-seller que fez sucesso escrevendo tramas de espionagem nada superficiais, ao contrário de contemporâneos como Ian Fleming (criador de um tal James Bond), temperadas pelo seu conhecimento dos bastidores dos serviços de inteligência, a qual diz ter frequentado em sua época de diplomata no início dos anos 1960.

Não é um filme de ação, muito pelo contrário. A ação existe, mas de forma bastante pontual e inusitada em duas ou três cenas. A história meio que demistifica os agentes secretos de cinema e transforma-os em pessoas reais, inseguras, falhas e incapazes de lidar com a vida pessoal.

A trama do filme segue os passos de Smiley, que seguindo os passos de Controle tenta descobrir a identidade do traidor, entrevistando ex-colegas e agentes de campo, além de tentar descobrir o porquê do fracasso da missão que levou a sua própria demissão do serviço.

Smiley, personagem que aparece em outros romances de Carré, é mostrado como se fosse um inofensivo e leal seguidor de regras no início da película, mas vai crescendo em profundidade psicológica, inteligência e determinação assim que os bastidores da trama e de sua vida pessoal são revelados.

O filme se torna rico em cenas sem diálogo que mostram a complexidade de personagens em gestos, olhares e comportamentos, a princípio contidos para só então revelar a importância que eles detém. 

Por exemplo, a cena em que Smiley fita um quadro na parede em sua casa vazia só tem sua importância revelada no final, quando se explica de onde o quadro veio.

É nesse vai-e-vem de tempos narrativos que a trama se constrói tendo algumas cenas-chave (como a da missão em Budapeste e a da festa de fim de ano) revisitadas a todo momento de diferentes perspectivas que revelam mais sobre o verdadeiro motivo da demissão de Smiley, do fracasso do seu casamento e da identidade do traidor da agência.
A produção, finíssima, reconstrói o clima dos anos 60 e 70 com exatidão milimétrica, tanto no uso de roupas de época quanto de carros, fitas de rolo e até bloquinhos de anotação, importantíssimos numa era pré-computador pessoal.

A trilha sonora completa esse pacote com perfeição nos inserindo num clima de boas séries e filmes de espionagem da época. Fica até difícil acreditar que o filme foi feito em 2011.

É claro que a narrativa se torna atemporal, pois na essência trata de relações de confiança tanto na vida pessoal quanto no local de trabalho.

Mesmo sem ação, as reviravoltas e revelações da trama conduzem o espectador a um final inteligentemente orquestrado, mas que pode se tornar inesperado para quem não está acostumado a filmes do tipo.

O destaque de atuação vai mesmo para Gary Oldman que interpreta um Smiley metódico e extremamente profissional, mas que não se furta a emoção em gestos e olhares pontuais e cheios de significados. 

Sua olhar de curiosidade num semblante frio enquanto observa um colega chorando por ter sua traição descoberta, por exemplo, revela muito sobre a motivação do personagem.

Um ótimo filme de espião, que reproduz o clima de insegurança da guerra fria, trabalhando relações de confiança e traição de maneira orgânica com reviravoltas que não devem nada a James Bond e outros personagens do tipo.

Recomendado.

Valeu!
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