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sexta-feira, 10 de junho de 2011

Livro: A Corrida do Rinoceronte

A função de um livro de ficção é nos livrar de nossos problemas por alguns minutos, horas ou mesmo dias. Um BOM livro de ficção pode até nos ensinar alguma coisa enquanto faz isso. Um ÓTIMO livro de ficção faz tudo isso enquanto nos torna mais conscientes de nós mesmos.

É nessa terceira categoria que dá pra enquadrar A Corrida do Rinoceronte (160págs), primeiro romance publicado pelo contista e novelista brasileiro Roberto de Sousa Causo (cujo último livro foi resenhado por mim aqui).

Editado pela Devir Livraria em 2006, o livro é definido como um romance contemporâneo com elementos fantásticos. 

Eduardo Câmara é um programador brasileiro que vai morar na cidade americana de South River, Califórnia, após ser recrutado por uma grande empresa. 

Sendo estrangeiro e mulato, começa a sentir o preconceito das pessoas da cidade para com ele.

Algo que nunca tinha sentido no Brasil, pois sua pele é clara para um negro.

Não resiste a um desejo de infância e compra um Chevrolet Camaro z/28 1969, vendido barato num posto de gasolina.

Acaba tendo que prestar esclarecimentos na delegacia de polícia, pois o antigo dono do carro participava de corridas ilegais

É quando o Rinoceronte-Negro aparece e ninguém parece vê-lo além de Eduardo. Ele segue o bicho e acaba sendo levado a trilhas secretas entre árvores cortadas ilegalmente.

Por causa de uma vizinha envolvida com o tráfico de drogas, se vê dentro das corridas ilegais e ainda tem que lidar com a insistência de seu chefe para que trabalhe na revisão de um software secreto do governo.

Tudo isso parece estar conectado de alguma forma e Eduardo, forçado pela visão quase-real do rinoceronte, vai ser jogado bem no meio e ser obrigado a tomar alguma providência.

A narrativa de Causo cativa pelas descrições vívidas da vida de um brasileiro no exterior, principalmente ao explorar o preconceito racial americano, bem mais forte que o brasileiro.

Um tema que o autor desenvolve de maneira sutil, porém eloqüente. Fazendo com que o personagem ganhe consciência de suas raízes sem abandonar a linha narrativa. 

Sua construção da trama surpreende pelo desenrolar imprevisível (apesar de bem fundamentado) que se desenvolve de forma gradual com um final inesperado pelo leitor e um clímax digno de um grande filme de ação.

Um ponto interessante é a construção da cidade fictícia de South River, que ganha muita personalidade nas palavras do autor. Seja pelo formato das ruas, pela história da sua fundação e pelas figuras ilustres ou injustiçadas historicamente (com as quais Eduardo se envolve), a cidade é um grande personagem da trama.

A quase-fantasmagórica figura do rinoceronte, que invade a trama logo no início (e faz participações importantes e pontuais) fascina pela construção descritiva, mas acabou se tornando uma decepção para mim, pois apesar de suas intenções serem claras, eu esperava uma explicação definitiva (e talvez sobrenatural)  para sua origem. O quê claramente não foi intenção do autor, talvez por destoar do clima urbano da narrativa.

Causo conta no pósfacio que certa vez teve um sonho com um rinoceronte que ficou na sua memória durante muito tempo e o incluiu na história para exorcizar essa experiência.

A cidade de South River surge na trama, segundo ele, em resposta a um desafio feito a escritores brasileiros para que escrevessem uma história num país diferente, mas com tempero brasileiro.

E ele consegue isso de várias formas. Pela sensualidade contida da policial Jennifer Adams, pelas memórias de infância de Eduardo e pela descoberta de sua identidade racial, justamente o ponto que pode fazer muitos leitores mais conscientes de si mesmo.

Um instigante suspense contemporâneo com subtexto ecológico e racial cheio de street machines dignas do filme Velozes & Furiosos e um rinoceronte mítico é que o esperar desse livro.

Recomendado.

Valeu!

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